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Viver o momento, nos lembra a nossa colaboradora Cris Zanferrari…

Foto Cris Zanferrari

Foto Cris Zanferrari

O post e o epitáfio

Por Cris M. Zanferrari

Dia desses uma notícia foi das mais acessadas na internet. Tratava-se de uma noiva americana que havia postado uma selfie oito minutos antes de ter a vida abreviada por um acidente de trânsito. É de se perguntar: por que virou notícia? E das mais acessadas? Milhares de pessoas, pelo mundo inteiro, postam fotos o tempo todo: do que fazem, do que comem, do que leem, do que compram, e, claro, de si mesmas. Mundo afora, muitas delas podem estar, neste exato momento, fazendo a sua última postagem.

Parece cruel. Parece sádico. Mas é a vida. Que basicamente continua a mesma, só que registrada. Todos sabemos que tudo o que vive e respira pode se acabar a qualquer momento: ao atravessar uma rua, ao pegar um avião, ao comer um fruto-do-mar, ao acordar ou ao dormir. A mais “indesejada das gentes”, como à morte se referia o poeta, é sempre superlativa: nos espreita nos momentos mais banais ou mais cruciais de nossas vidas. Fôssemos pássaros, ela nos colheria em pleno voo.

Por que então ficamos chocados e perplexos diante de uma selfie de alguém que morreu minutos depois do click? Talvez seja por uma razão muito simples: porque o retrato poderia ser o nosso. E porque só quando vira notícia é que nos damos conta dessa brutal realidade. Sim, porque precisamos que a morte tenha um rosto, tenha uma história. Só assim nos comovemos. De resto, são apenas estatísticas o que os jornais nos apresentam.

A verdade é que andamos distraídos. Muito distraídos. Distraídos do que verdadeiramente importa, do que verdadeiramente conta. Nossos dias são frenéticos, nossas noites insones, nossos minutos contados. Literalmente contados. Fatalmente contados. Soubéssemos quantos nos faltam à contagem final, talvez nos apressássemos em ser felizes, em desfrutarmos mais da companhia de quem amamos, em reduzirmos as preocupações, os compromissos, as mágoas e os rancores. Andaríamos mais leves, de corpo e alma. Abraçaríamos mais, beijaríamos mais, dançaríamos mais, perdoaríamos mais. Porque superlativa mesmo deve ser a vida. Que é feita de momentos, esses mesmos, que registramos com nossas câmeras e celulares e que eternizam, assim, nossa juventude, nossos amores, nossos gostos, nossas viagens, nossas rotinas e, sobretudo, o nosso modo _ que é só nosso mesmo_ de ver o mundo.

O último post da jovem americana foi seu mais legítimo epitáfio. Estampava um sorriso feliz, sincero, de puro contentamento. De quem levava a vida como a vida deve ser levada: abraçando o momento. Porque só quem perde o momento é que está de fato perdendo a vida, ainda que tenha um coração batendo e esteja respirando.

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