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Quando TAG dá o tom, por Cris Zanferrari

"[...] Quero ser longe. Eu respondia: ninguém é longe. As pessoas são sempre perto de alguma coisa e perto delas mesmas. A minha irmã dizia: são. Algumas pessoas são longe." Valter Hugo Mãe, em excerto colhido em "A desumanização".

“[…] Quero ser longe. Eu respondia: ninguém é longe. As pessoas são sempre perto de alguma coisa e perto delas mesmas. A minha irmã dizia: são. Algumas pessoas são longe.” Valter Hugo Mãe, em excerto colhido em “A desumanização”.

Mais um ótimo texto da nossa colaboradora, Cris Zanferrari.

Como no texto do Professor Carneiro, (AQUI), acredito que esta síndrome, TAG, entre um pouco nas neuras modernas.  Os italianos são bem assim.  Interessante a sensação que se preocupar, no fundo, é um escudo… (#quemnunca?).  O foco, acredito, ser no domar, tomar a vida pelas rédeas, ou como diz Cris, aprendendo a gerenciar…

Quando o TAG dá o tom

Por Cris M. Zanferrari

Você certamente já ouviu falar em TAG. Se pensou no marcador das redes sociais em forma de jogo-da-velha, sinto informar: enganou-se. O TAG em questão é a sigla médica para o Transtorno de Ansiedade Generalizada. Mas para os acometidos pelo mal, ou para quem com os acometidos dele convive, bem poderia ser Total Ansiedade me Governa, Tudo Aparenta Gravidade, Toda Angústia me Germina, ou ainda, caso queiram complementar, Tô Aceitando suGestões.

Brincadeiras à parte, o TAG é coisa séria. De uma gravidade impensável para os felizardos que nunca o conheceram. Imaginem só: para quem carrega o fardo de sempre se fazer acompanhar por uma terrível ansiedade, qualquer atividade, mesmo a mais corriqueira, representa uma possibilidade de catástrofe. Parece exagero, mas não é. Isso porque o ansioso em potencial é movido por determinadas crenças, tais como sempre acreditar no pior. É isso mesmo. É pensar no filho indo sozinho pra escola pela primeira vez e já uma cena terrível se configura na mente atormentada: será assaltado, atropelado, sequestrado. Não há meio-termo. Tudo é_ com o perdão da redundância_ assustadoramente assustador.

O sujeito com a ansiedade à extremada potência não sabe, mas a crença que o sustenta é a de que sua preocupação exacerbada funcionará como um escudo protetor contra os infortúnios. Lá no fundo, bem no fundo, sua equação é mais ou menos assim: “preocupo-me, logo estou a salvo.” Por exemplo: o camarada precisa pegar um voo por razões profissionais. Antes mesmo de entrar no avião, começa a suar frio, sente-se como se o coração fosse saltar pela boca. Ninguém percebe, mas por dentro ele treme e agoniza como se estivesse entrando em uma câmara de gás. Dentro da aeronave, alimenta um sem-fim de pensamentos negativos a cada sinal de atar o cinto, a cada ruído desconhecido, porque, sim, ele está atento a tudo, seu corpo inteiro é um radar captando sons, cheiros, cenas, ameaças. Ao chegar outra vez em terra firme, está acabado, exaurido pela energia que consumiu antecipando uma catástrofe que não aconteceu. Mas a sua preocupação impediu o avião de cair. Essa é sua crença. Evidentemente que ele não tem consciência dela, do contrário bastaria abandoná-la.

A verdade é que o TAG é como um maestro: vive dando o tom. Que nunca é andante ou adagio, já que tudo é demasiado intenso e ligeiro para a mente ansiosa, incapaz de relaxar. Um de seus tons prediletos é a hipocondria. Orquestrado pelo TAG, o indivíduo pode colecionar tiques nervosos, alergias, idas ao cardiologista, e inúmeros diagnósticos imprecisos. Poderá passar anos transitando pelos consultórios médicos até descobrir que o mal que o aflige não é de ordem física, embora no físico esteja refletido e refratado.

No fundo, no fundo, o indivíduo por trás do TAG é, na verdade, um grande controlador. Pensa poder controlar o mundo ao seu redor. É detalhista, perfeccionista, e, claro, sempre muito preocupado. Por isso, vive tenso, sobrecarregado, irritado, como se levasse _ e de fato leva_ o mundo nos ombros. Se algo foge ao seu controle _ melhor dizer, ao controle que ele pensa ter_ , tudo passa a provocar medo. Medo de não cumprir os prazos, medo de esquecer o filho na escola, medo disso, medo daquilo. Medo.

Sim, todos sabemos que o mundo é hostil, violento e imprevisível, conforme se vê nas ruas e nas manchetes por aí. Mas, “há neste mundo mais medo de coisas más do que coisas más propriamente ditas”. Quem diz isso é Mia Couto, premiadíssimo escritor moçambicano, e isso pode nos dar esperança. Esperança é algo de que o ansioso carece mais do que ninguém. Porque mais do que ninguém, o ansioso é um desesperado, porque tudo _ t-u-d-o_ na sua mente já aconteceu. O concerto já há muito desafinou.

A boa notícia é que o maestro não é a orquestra, assim como o mapa não é o território. O TAG pode estar lá, tentando reger sua vida, mas o instrumento está nas suas mãos, e como você vai manuseá-lo para produzir o som só depende de você. Alguns acordes podem ajudar a afinar seu dia a dia: uma psicoterapia, uma aula de yoga, uma atividade física qualquer, aprender meditação, aprender a conjugar os verbos “aceitar” e “entregar”, cultivar a espiritualidade, cultivar amizades, exercitar a prática de mindfullness*, regar a vida com momentos de lazer, dedicar-se a ser feliz.

Assim, quando alguém perguntar “E o seu TAG?”, que você possa respirar bem fundo e, sem o mínimo sinal de ansiedade, responder: “To Aprendendo a Gerenciar.”

 

*A técnica de mindfullness está descrita no livro “Livre de ansiedade”, de Robert Leahy.

Cris em uma de suas primeiras selfies!!…

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