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Sobre Dor…

dor

Cris…

Cris é uma amiga virtual.  A conheci nessas páginas do blog e entre um email e outro viramos amigas.  Ela colabora há anos aqui no Consueloblog e seus textos, inspirados em passagens literárias, sempre me explicam a vida um pouco melhor.  São aquelas sutis observações que esclarecem tornando o viver mais leve.  Mais doce.  

Este é outro de seus lindos textos, original para nós.  Se quiserem ver mais, Cris tem o seu blog Mania de Citação (AQUI) e Instagram Prosa e Poesia (AQUI).


 

IRMANAR-SE (OU: SOBRE DOR)

 

“[…] um amigo me chamou para ajudá-lo a cuidar da dor dele.

Guardei a minha no bolso. E fui.”

Caio Fernando Abreu

Cris M. Zanferrari

 

Todo mundo tem uma dor. Parece uma banalidade de se dizer, mas da próxima vez que você começar a se sentir arrasado, deprimido, desanimado ou invejar uma postagem glamorosa nas redes sociais, achando que falta glamour na sua própria vida, lembre-se: essa pessoa, que recebeu milhares de curtidas e sorri em uma selfie para a câmera, também tem uma dor.

Não, não me compraz nem um pouco saber que todas as pessoas padecem, sofrem, que a vida dói. Ao contrário, sinto uma pena enorme de saber que ninguém, absolutamente ninguém, é imune a dor. Por outro lado, e não existindo no mundo o sofrimento, por que outra razão haveríamos de nos solidarizar uns com os outros? Pois sim, a dor existe para nos irmanarmos. Um exemplo? Tem gente que só descobre o quanto é amado quando anuncia estar com câncer. É mencionar a palavra fatídica e as pessoas em redor se mobilizam, se prontificam a ajudar, levam uma palavra de consolo, recomendam terapias diversas, rezam, oram, se fazem presentes, se (re)aproximam. Sim, a dor do outro nos comove e, de alguma forma, tira-nos do centro de nossa própria dor.

Faz alguns dias assisti __ e preciso dizer que foi assim, meio ao acaso, porque talvez não o fizesse de caso pensado__ o documentário “Gaga: Five Foot Two”, produzido e estrelado pela própria cantora, e o que vi na tela foi muito mais do que um ícone pop, foi a imagem de um ser humano fragilizado pela dor. Ok, pode até ser que o filme seja uma estratégia de marketing para promover a nova fase musical de Gaga, mas há que se reconhecer que as cenas de dor protagonizadas pela estrela passam bem longe do glamour. E se o sofrimento de Lady Gaga em nada difere do sofrimento de milhares de pessoas com fibromialgia é precisamente porque a dor não faz distinção, antes nos iguala, nos faz perceber o que realmente somos: semelhantes.

Claro, nem todas as dores se fazem visíveis, aparentes, palpáveis. Há dores psíquicas, existenciais, emocionais. Há dores inconfessáveis, inexpugnáveis, inconsoláveis. Sendo dor, dói. Além de tudo, é intransferível, tal como o próprio nome da gente. O importante é que cada um reconheça a sua porque, afinal, nada nos torna mais íntimos de nós mesmos do que a dor com que __ aprendemos ou temos de aprender__ a conviver.

E por falar em convivência, importa notar que toda dor é incomparável. Jamais pense em minimizar a dor do outro ao compará-la com a de alguém que, na sua opinião, sofre mais. A dor é exclusivamente de quem a sente e quem a sente está sentindo segundo a sua própria escala de dor, que só varia a partir de si mesmo. Então, se regra há, há de ser esta: diante da dor do outro, calar. Diante de nossa própria dor, escutar. É que a dor sempre tem algo a nos dizer, a nos mostrar. A dor é uma voz. Cada um só pode ouvir bem a sua própria. Às vezes, dói baixinho; às vezes, dói alto. É uma voz que nunca se cala; no máximo, concede alguns raros momentos de trégua.

Por isso__ e parece outra banalidade de se dizer__ a verdade é que se a gente olhasse para o outro e enxergasse no fundo dos olhos, além da cor, a dor que o indivíduo carrega, talvez a gente passasse a se olhar, uns aos outros, mais demoradamente, com mais compaixão, tolerância e alguma compreensão. Talvez a gente escutasse mais, perdoasse mais, se a gente entendesse, enxergasse e aceitasse que todo mundo, neste mundo, tem uma dor. Não servindo isso de alívio ou consolo, que sirva para sermos mais irmãos.


Outros textos lindos de Cris aqui do blog:

O que melhora o mundo por Cris M. Zanferrari
Mãe – Rivotril
Além do Bojador
Cuidar das Palavras

 

Oliver contemplativo…

 

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