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Crônica: Assim, sem mais nem menos…

Queridos do salotto, permitam-nos de dividir o choque e a dor da perda de uma amiga, de um nosso luto, desta forma pública e sentida.  Alessandra, minha irmã, e sensível escritora, reflete sobre a perda e como justificá-la.

BASTA ESTAR VIVO…

 

Esse final de semana, uma amiga minha se foi. Assim, sem mais nem menos, morreu.

Não era uma amiga íntima, era mulher de um grande amigo meu. Ela não fazia parte do meu cotidiano e, neste aspecto, não vou sentir falta dela. Mas sei que sua simples ausência deixa um buraco no mundo. Já sinto ele mais pobre.

Sua morte foi cheia de mistério e tem sido alvo de especulações estratosféricas sobre o como e o porquê. “Mas ela era uma pessoa tão alegre!”, dizem uns. “Não, essa alegria escondia uma profunda melancolia.”, opinam outros.  Eu também, especulando, especulando… Mas essas especulações não são mais do que dedos em riste, bússolas sem norte, procurando algum responsável físico, emocional, exotérico. De que adianta? Ela se foi e o mundo saiu perdendo. Não tem um culpado, ninguém causou essa tragédia. Aconteceu. Acabou.

Às vezes penso nela e ponho suas qualidades numa lista:

  1. Generosa
  2. Altruísta
  3. Atenciosa
  4. Amorosa
  5. Sorridente (e um lindo sorriso ela tinha)
  6. Sensível
  7. Preocupada
  8. Inteligente
  9. Bonita
  10. Elegante

Às vezes tento descrevê-la: Uma pessoa que colocava os outros à frente. Fazia de tudo (tudo mesmo) para que aqueles que amava estivessem bem. Quando sua filha nasceu, pintou um mural deslumbrante no seu quarto: lúdico, alegre, o sonho de qualquer criança. Gostava de cozinhar, alimentar, apaziguar. Organizava lindas festas. Mesmo com aqueles que não conhecia tão bem, mostrava legítima preocupação. Sorria, perguntava, ouvia. Ficava feliz com os sucessos, mostrava preocupação com as dificuldades. Era artista plástica. Sensível. Morena, muito magra. Sempre elegante. Um lindo sorriso sempre disponível…

Mas é só a minha versão. Uma no meio de muitas.

Outras vezes fico me perguntando por que tanta gente bacana morre tão cedo. Me vem à cabeça uma teoria que diz que são pessoas especiais, com uma luz muito forte. Elas vêm com uma missão a cumprir. Cumprem e logo a luz, de tão brilhante, queima. Penso em outra teoria que evoca a cruel ironia da vida. Somos vítimas de um Deus irônico que gosta de tirar com a mesma facilidade que ele dá. Por fim chego à conclusão de que tudo é obra do acaso. Sim, pessoas muito especiais vão embora muito cedo. Outras igualmente especiais morrem bem velhinhas. Inversamente, psicopatas agressivos também morrem muito cedo ou muito tarde. Ninguém percebe, pois eles não fazem falta. Ser bom não é garantia de uma vida mais longa, nem mais feliz. Como dizem os portugueses: “Para morrer, basta estar vivo.”

Mas o que tem acompanhado meus pensamentos e me causado mais tristeza é pensar na dor dos que ficaram. A mãe que enterra um segundo filho. A filha adolescente que ainda não se deu conta direito do que aconteceu. Meu amigo, que além da terrível dor de perder de sua companheira, ainda testemunhou a violência arrebatadora de uma morte precoce.

Penso muito, muito mesmo. Nela, nas pessoas que a circulam, no acontecido, no mundo, no universo, em Deus. Penso, choro, fico deprimida, tento fazer o que posso para ajudar aqueles que ficaram. Mas o tempo passa, e temos de levar nossas vidas adiante. Business as usual. Tudo igual. Apenas com uma leve sensação, uma nuvenzinha que me acompanha e reforça o sentimento de que a vida é frágil. De que estamos aqui um dia e no outro não mais. Assim, sem mais nem menos, morremos.

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